se mexer, transbordarei

Tal como uma taça à beira de transbordar, se mexer, transbordarei!

Nós sempre sabemos o quanto está ruim aqui dentro de nós, tal como se sabe o quanto está ruim aqui fora também, a gente só faz de conta que não está vendo a bagunça, sentindo a dose exagerada de sentimentos confusos, pensando no avalanche de questionamentos que espremem o coração, que parece intentar querer fazê-lo parar de bater.

A gente ignora a falta de ar repentina. As olheiras persistentes que não somem, nem mesmo com a melhor maquiagem. A gente empurra com a barriga os afazeres acumulados e diz que “tudo bem, amanhã eu faço“… arrasta as pernas por aí, tentando não demonstrar muito o nível descomunal de exaustão. Até rimos, rimos de muito nervoso. Até falamos sobre banalidades, muitas banalidades para silenciar as coisas realmente sérias que machucam.

Chega a noite uma taça de um vinho barato do mercado e um bolo de caneca feito rapidamente no microondas aquietam a ansiedade o tanto que podem (quase nada, na verdade). Tento de algum modo vomitar essa quantidade ensurdecedora de dizeres na tela do computador, o que um dia fora até fácil, hoje já não posso dizer o mesmo.

Algumas vezes quando fecho os olhos, eu me considero estar bem. Imagino o meu possível mundo perfeito, fico lá um tempo, mas nunca é suficiente, pois logo a realidade bate a porta e me desperta, entra e me tortura e eu volto exatamente ao ponto anterior de angústia. Por vezes, não há nada que possa ser feito, então me calo outra vez.

Eu sei que uma hora ou outra vou inundar tudo e me afogar nesse mar de palavras não ditas. Sou tal como uma nuvem escura carregada, há raios vez ou outra, às vezes até trovões. É nítido que vem tempestade. É óbvio que quando eu chover não vai ter previsão de estiar, mas sei que uma hora a chuva há de passar ou ao menos me esforço a crer nisso. Até lá eu ignoro as previsões do meu radar. Sirvo outra taça de vinho e olho a lua da porta do chalé que chamo de casa, a tal lua que por sinal, hoje está deslumbrante e cheia. Anseio me esquecer e me esqueço por alguns minutos. Amanhã quem sabe, eu transbordo de verdade.

Por: Francielle Santos

(Foto: Reprodução / Photagrafer)

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