
Não posso mais manter a minha farsa. Não posso mais esconder o sangue das feridas que transcende a minha pele e mancham as minhas roupas. Não posso mais sufocar o mal cheiro das emoções apodrecidas dentro de mim. Não posso evitar contar da minha tristeza descrita minuciosamente pelo meu olhar perdido e desencontrado. Não dá mais para esconder o rastro miserável dos meus erros e fracassos e por mais que exista uma infinitude de palavras no mundo, eu não tenho mais um argumento sequer para justificar ou ganhar tempo ou explicar tamanho caos.
Existe uma criança medrosa e carente dentro do meu corpo adulto. Uma criança que suplica por colo e confronta a orgulhosa adulta que não quer dá o braço a torcer, por mais que saiba, que se não acolher essa criança vai morrer engasgada com todas essas palavras não ditas, com todas essas dores no corpo, essa fadiga na mente e com os destroços do seu coração.
A criança pouco entende da teoria que diz que basta chorar, que a angústia vai passar. Basta falar e berrar o que está doendo, que vai parar de doer. Basta dizer o que quer e terá o que quer. A criança pouco sabe como por tudo isso pra fora. A criança pouco conhece de tudo isso que a tormenta. Por isso foge. Por isso se esconde.
A adulta incansavelmente tenta ignorar a birra, o esperneio da criança interna. Tenta catalogar cada ferida. Justificar cada perda. Explicar cada fracasso. Persiste em desenhar possíveis rotas e caminhos que façam algum tipo de sentido, que a levem na direção do que deseja. Ela continua em silêncio. Fazendo de conta. Todos os dias silencia a criança como pode. Coloca a máscara que possa esconder sua verdadeira face. E atua como se fosse a última apresentação no Teatro Municipal da cidade. Mas nem sempre se sai tão bem como planeja. Esforçar-se à dizer que está tudo bem. Ou ao menos que vai ficar tudo bem. Porém, nada garante que de fato isso aconteça.
É só um dia! Isso é só um dia ruim! Insisti. Desisti. Recomeça, na manhã seguinte.
Por: Francielle Santos
(Foto: Reprodução / Medium.com)
Todos os dias são recomeços, às vezes a gente nem percebo.
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Tem razão !
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