a dor de ser

Eu reconheço o meu caos. Eu reconheço a minha desordem interna. Eu sei o quão putrefato algumas feridas estão dentro de mim e o quanto o odor é fétido. Eu sei que está quase tudo apodrecido, é assustador ao ponto de dar desespero na minha espinha.

Por vezes, tenho até vontade de colocar tudo para fora daquele jeito nojento, pois não aguento mais essas coisas se revirando aqui dentro do meu estômago e quase sempre sinto os ímpetos da expulsão involuntária, porém os meus lábios se cerram e eu sou obrigada a engolir e sentir o gosto amargo e azedo garganta abaixo.

Eu sei que se um dia o meu peito se abrir de cima abaixo (e vai acontecer logo), vai ser como um tsunami devastando tudo o que consegui juntar até aqui com muito esforço. Já aconteceu algumas vezes, em proporções menores, causando estragos, mas nada que eu não pudesse de certo modo fazer de conta que não foi algo assim tão grave.

Caminhei entre os destroços, encontrei duas ou três coisas incrivelmente ainda inteiras e mudei para outro lugar. Todas às vezes, sai aparentemente convicta de que era a coisa mais certa e óbvia à se fazer sem olhar para trás, sem levar muito, quase nada na verdade e eu disse incansavelmente para eu mesma, que eu ficaria bem, porque no fim, a gente sempre fica bem.

Fico bem, ainda que de um jeito esquisito, mas minimamente com o conveniente para continuar vivendo. E também afirmo, convincente, com um riso amarelo no rosto para as pessoas que assistiam de forma indireta e incrédulas esses meus passos, que eu vou mesmo ficar bem! (elas acreditam ou fingem melhor que eu)

Por outro lado, se cada vez eu procurava estar mais longe, eu procurava encontrar menos olhares como os meus me julgando ou me lembrando sobre tudo o que eu havia perdido e fracassado. Eu nunca fui capaz resistir por muito tempo as perdas, tão pouco as partidas daqueles que amei de diferentes jeitos e por diversos motivos. Eu nunca soube lidar com a explosão da sensação de queda e consequentemente, todas as vezes eu cai e mesmo quebrada, juntava os cacos e logo eu partia de novo.

Em todas as partidas pouco levei de mim mesma, embora muito eu tenha carregado de tudo e todos. E não poucas vezes, a dor intolerável me conduzia silenciosamente ao precipício, por não saber mais como continuar longe, tão pouco perto. Eu me perdi inúmeras vezes tentando fugir da dor de não ser capaz de ser eu, fugindo do inevitável encontro com a minha própria escuridão.

Por: Francielle Santos

(Foto: Reprodução / Beauty Scene)

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