de duas, só sobrou eu

Coração me fala, como você faz um negócio desses, trocar o pra sempre por às vezes ?”

Quando a gente trai quem a gente ama é como ficar embriagado. A bebida encoraja, levanta o humor e deixar acinzentado algumas coisas que são certezas de que você jamais faria e alterado você vai lá e faz. Mas assim como para ficar bebado você precisa beber mais que um drink, para trair, por vezes, você precisa alimentar as intenções. Ninguém fica embriagado só com a primeira dose. Ninguém trai só com o primeiro olhar.

Quando eu me dei conta do estrago, aquela quem me esperava em casa já não me esperava mais. Ela não me deu o troco ou qualquer coisa assim. Ela nem me esperou para gritar comigo, jogar as minhas roupas pela janela ou me seguiu de táxi e me pegou em flagrante em um motel barato como se vê nas novelas.

Ela saiu de finininho. Silenciosa. Retirou-se como se nunca estivesse estado lá. Ficou só o cheiro dela nos lençóis e o buraco em cada parte de nosso pequeno apartamento, que agora parece enorme.

Eu nem faço ideia de como ela me descobriu, mas eu sei que ela descobriu. Não faço ideia de quanto tempo faz que ela ouvia as minhas mentiras esfarrapadas e fingia que acreditava. E eu me sentindo o cara, até me enaltecia por conseguir engana-lá tão bem. Pensando que estava iludindo a minha mulher e eu quem estava me enganando de fato.

O problema das mentiras é que elas envenenam mais ainda quem as conta. Eu achei que dava conta. Não dei, óbvio! Ninguém da conta de manter duas mulheres enganadas ao mesmo tempo, por muito tempo. Uma hora, uma ou a outra descobre, e quando acontece você perde as duas.

Eu perdi primeiro a mulher que ficava em casa todos os dias. E no começo, achei que a que me aguardava só por alguns dias da semana me bastaria. Não bastou. O que eu tinha por ela perdeu a graça, como uma bebida que você bebe sempre e não tem mais com quem superar a ressaca. Enquanto uma me colocava em delírios, a outra me curava.

Lembro de considerar a hipótese de fundir as duas em uma só. Mas isso era humanamente impossível. Por falta de não conseguir abrir mão de quem me entorpecia e nem de quem me curava, eu as mantive o quanto pude. Errado. Eu sei. Todos sabem. Mas se serve de consolo: agora estou eu aqui, apodrecendo sem as duas, com uma saudade miserável daquela quem me esperava e quando eu não chegava saciado, também me saciava, agora vejo.

O problema é ver as coisas tarde demais. Ver que a mulher que me aguardava em casa também podia ser como a outra, antes de eu torná-la apenas na mulher que me esperava.

Por: Francielle Santos

(Foto: Reprodução / Freepik)

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