
— me conte uma coisa boa
Ela tinha tanto medo de morrer, que se tivesse que morrer tinha de ser aos braços do som da voz dele a dizer sem sombra de dúvidas: “você amor, você todinha é a coisa boa”. Ela sabia que aquilo não era uma verdade. Mas o que pode não ser verdade quando quem está a dizer o que quer que seja é aquele a quem se ama? E ela o amava. Bastava amar para ela estar viva de novo. Amá-lo para viver, mesmo com a vida toda escapando pelos pulmões.
— me diz que não se esqueceu
Ele não fazia a menor ideia do que ela estava dizendo. Ele nunca fora bom de memória. Ela sabia. Todos sabiam. E com certeza ela estava lhe pregando uma peça. Ele amava quando ela o tentava pregar peças, só para dizer “te peguei seu bobo” daquele jeito malicioso dela, com aquele riso grande nos olhos que lhe algemava os punhos, os olhos, o coração. Ele não se entregava fácil. Ainda que fosse uma peça pregada ele não se dava a chance de a decepcionar. Por via das dúvidas, é sempre melhor duvidar para tentar nunca decepcionar quem se ama. Por mais que ele a decepcionasse todos os dias. Pudera não é feito dessa natureza falível, imperdoável, que ela não cansava de perdoar. Amar é perdoar.
— me diz que já está na rua de casa
Ela sempre tinha pressa dele. Todo dia a urgência soava como se estivesse à beira de um ataque cardíaco e por vezes estava mesmo. Mas até nos dias que não tinha pressa, tinha pressa. O amor e suas irracionalidades. Quem ousaria explicar ou questionar? Ela nunca fora boa em esperar. Quando estava sendo feita por Deus, tinha certeza, na fila da paciência ela passou bem longe. Porém, mesmo sem paciência nenhuma esperava, todo dia, tinha que esperar ele chegar. O amor e as suas condicionais cretinas! Quando ama, espera. E você que se vire com o resto todo que se custa para esperar. Espera, independente de todos os pontos que ainda estão para pôr nos i’s.
— me diz o que eu não posso nunca esquecer
Que “eu estarei sempre aqui” ele sussurrava no pé do ouvido dela, enquanto ela soluçava baixinho debruçada sobre o peito dele no sofá da sala. Era sempre ali que a vida acabava. Era sempre ali que a vida tornava a ser. Quando se é um mundo de solidão mesmo tendo o mundo aos teus pés, a única coisa que faz viver é a presença de quem se ama a estar. Tudo se resume a estar. Sorrir, é estar. Ouvir, é estar. Olhar, é estar. Tocar, é estar. Abraçar, é estar. Beijar, é estar. Alcançar, é estar. Estar, é estar. O resto, bem, é isso mesmo, resto!
Por: Francielle Santos
(Foto: Reprodução / Haley Terrell Photography)