um ano

um ano. e tudo ainda dói cruelmente por dentro. consome o meu corpo inteiro. destrói a minha capacidade de acreditar no amanhã como antes.

evitei por meses prestar atenção no calendário, no relógio no pulso – não queria me dar conta do tempo passando depressa e eu ficando para trás.

me tranquei no quarto. nunca mais quis abrir as cortinas. preferi dormir durante o dia e ficar acordada pelas madrugadas, porque perceber, ainda que pelas frestinhas da janela o brilho do sol lá fora, me adoecia. me adoecia saber que os dias estavam me escapando pelas mãos como areia fina que escorre entre os dedos.

evitei o quanto pude os olhares. as vozes questionadoras. os abraços de seja-bem vinda. os risos curiosos que diziam “dessa vez você veio pra ficar“. aquilo me cortava por dentro. era como adagas enfiadas no meu peito. pedaços de pau inteiros atravessados entre as minhas costelas.

dias inteiros de hemorragia emocional. e eu me perguntava quanto tempo mais precisaria para aquilo acabar comigo de uma vez. eu exalava sangue e dor e ninguém se dava conta.

sobretudo, estou exausta de ter que explicar. é inútil tentar mostrar o que dói para pessoas que não estão dispostas a ouvir, só a convencer o quanto você está errada e bla-bla-bla. às vezes, tentar mostrar o que dói é o mesmo que dar soco em pontas de facas – e as pessoas que mais amamos são as facas mais afiadas.

nem posso crer que já faz um ano que eu cedi ao medo e fugi da felicidade. só de lembrar as minhas pernas desfalecem. preciso deitar. o meu corpo inteiro reclama. afogo-me no rio de lágrimas que jorram de mim. queimo em febre. e não há um antídoto que faça esse fim ser menos doloroso.

por vezes, torço para ser só um pesadelo em que preciso acordar.

Por: Francielle Santos

(Foto: Reprodução / The Artbo)