
— Esse quarto me sufoca.
Todos os dias quando abro os olhos encaro essas paredes. Já faz dez anos que elas me cercam, escondem, apertam-me. Lembro de quando a casa já estava em fase de acabamento, entre uma briga e outra com o meu irmão ou a vontade de parar de ouvir toda a barulheira da casa antiga, eu subia e passava horas projetando o futuro do meu quarto, o futuro da minha vida.
Fiz muitos planos para ambos. Da cor das paredes, as cores que eu usaria pelas ruas. De onde colocaria cada móvel a como cada curso completaria o meu currículo. Era como brincar de casinha, mas com uma casa/quarto de verdade; como poder ver um pedacinho do futuro através das paredes da casa nova.
Lembro da primeira noite que dormi no quarto todinho e só meu. Tranquei a porta e senti como se finalmente estivesse conquistando a minha privacidade e liberdade. Deixei a janela aberta, pois queria acordar com os primeiros raios de sol. Ainda não tinha móveis novos, tudo estava pelo chão, inclusive eu. Imaginei como poderia ser ainda maior e melhor a sensação do dia que eu estivesse em uma casa todinha e só minha, sorri para as paredes, como se confessasse esse segredo.
Essas mesmas paredes que tanto gravei segredos por debaixo de decorações ousadas – a melhor de todas foi quando colei pedaços de jornal e revista com matérias sobre intercâmbio em uma delas inteirinha. Também, me viram horas e horas fazendo check list para tudo (será que existe profissão para organizador de check list? porque eu sou muito boa nisso). Elas que também testemunharam os meus momentos de fúria e assistiram-me caída no chão, quando tudo o que restava à fazer era molhar o piso com lágrimas.
Não lembro bem quando elas deixaram de ser minhas companheiras, para se tornarem o meu carrasco. Quando deixaram de ser meu porto seguro para ser grades da minha prisão, mas agora, é tudo o que são. O lugar que parecia enorme, me aperta, não me cabe mais.
Todos os dias encaro a minha mala vermelha e ela me provoca:
— O que é que você está esperando? – questiona ela debochada.
— A vida. – respondo cansada.
Por: Francielle Santos
(Foto: Reprodução / Belezas da Vida)