
há semanas que eu não conseguia sequer segurar um lápis em frente de uma folha branca. encarava o tracinho piscando na tela do notebook, do celular e não consegui digitar nada. estava engasgada, abarrotada de lembranças tuas, que foram resurgindo dos jeitos mais absurdos possíveis, nas pessoas mais improváveis. me senti apavorada nos dias em que precisei sair de casa com medo de te encontrar na rua – eu sei que essa ideia é hipotética, mas mesmo assim, a mínima possibilidade fez com que as minhas pernas tremessem enquanto eu caminhava.
não demorou para eu revirar as caixas em busca de detalhes teus. e me senti, fracassando, miseravelmente comigo de novo. porque ao longo dos anos que você esteve na minha vida, tudo o que você me deixou foram lembranças abstratas. de tantos aniversários juntos, você só me presenteou uma única vez (bem verdade que eu nunca fiz questão, mas também é um retrato do seu interesse em, sei lá… memorizar?). lembrei, que na verdade você nem se lembrava. sempre vinha dois, quatro, seis dias depois me pedindo um milhão desculpas pelo Feliz Aniversário atrasado, depois me levava para comer alguma coisa que eu gostava e eu sempre te desculpava, não só essas faltas, não é?
ai, eu lembrei de todas às vezes que você foi a minha única prioridade. de todas as surpresas que fiz, como quando eu trouxe o seu presente pessoalmente depois de seis horas de viagem do Rio de Janeiro à São Paulo – e mais uma vez eu te dava o primeiro feliz aniversário do dia, e teve aquela outra vez, que peguei o Uber faltando vinte minutos para meia-noite, toquei a sua campainha e bem, você sabe o que aconteceu…
lembrei, dos cartões postais que enviava primeiro pra você de todas as cidades que conheci, enquanto estive fora. das ligações que fazia questão de fazer, mesmo podre de cansada, com o fuso horário nada favorável, no meio do oceano atlântico, sentada nas escadas frias das áreas de crew.
lembrei, dos segredos que só com você dividi. lembrei, das novidades que só com você fazia sentido compartilhar em primeira mão.
lembrei, dos almoços improvisados e você dizia que era o melhor macarrão com salsicha que você já tinha provado – e você sempre mentia tão mal pra mim! no entanto, o que importava eram as tardes depois do almoço que a gente dividia a vida. as voltas pra casa reclamando do transito, da política. você nunca concordava comigo. e a gente sempre brigava até rir de alguma coisa estupida que um ou o outro falava.
lembrei, de nunca precisar esconder nenhuma paixão de você, mesmo que por vezes, você sentisse um pouco de ciumes. ainda assim nunca me repreendeu, sempre me ouvia pacientemente, tentava me entender e muitas vezes, era o ponto de sobriedade nas minhas loucuras. assim como do lado de cá, a reciproca era completamente verdadeira, apesar do medo de te perder, saber de todas as suas histórias e aventuras, sem exceção, era o que fortalecia a nossa amizade.
você foi o único melhor amigo que eu tive. e também, foi a única pessoa que eu amei de verdade.
hoje, eu quis muito te ligar pra te contar em primeira mão que tirei de novo aquele projeto da gaveta, mas que dessa vez eu vou mesmo até o fim, nem que seja a última coisa que eu faço na minha vida. na página de dedicatória estão as suas iniciais (quando me dei conta, já estavam lá, talvez até a escrita do ultimo texto eu mude, mas queria que soubesse disso). estou até imprimindo as novas páginas do meu livro. queria te contar que todos os textos em que meu coração derrama amor, são traços de você: são sobre a nossa amizade, as nossas brigas, as nossas diferenças, as nossas reconciliações a bisnaga quente e requeijão, os nossos abraços e claro, são sobre os nossos orgasmos.
não tenho mais o seu numero na minha agenda de contatos e nem na minha memória – sempre temi que esse dia chegaria. também não tenho mais redes sociais – logo, não corro o risco de mandar um direct por puro impulso ou sob efeitos do calor da emoção. te escrevo aqui, mesmo sem a menor chance do alcance ser em você. talvez, eu até volte aqui para te contar mais (sinto tanta saudade de conversar contigo). não faço ideia de como você está, aonde está, com quem está, contudo, ainda te sinto perto. não tenho mais você em nada na minha vida, mas ainda tem muito de você em mim, e já passou da hora de eu me conformar e aceitar, que o amor que é teu no meu peito, também sou eu.
Por: Francielle Santos
Ps.: a saudade da nossa amizade é eterna!
(Foto: Taily)